Por Cíntia Cury
Candidatos aos diversos cargos disputados nesta eleição e de todas as colorações partidárias têm se mostrado apreensivos nos últimos dias com suas campanhas eleitorais nas redes sociais. Figuras com sólida experiência no discurso político e na apresentação em mídias tradicionais “apanham” para aumentar suas exposições, fortalecer suas imagens, conquistar seguidores e gerar o tão sonhado engajamento online. E a redução do tempo de propaganda eleitoral na televisão e no rádio só faz aumentar a ansiedade desses candidatos e equipes.
A questão, porém, está na dinâmica das mídias sociais. Muito se fala em celebridades instantâneas, postagens que viralizam e ganham o mundo em poucos segundos, mas essa não é a regra. Muitos dos chamados influenciadores digitais trabalharam duro ao longo de um período considerável para chegar onde estão hoje. E seguem no trabalho árduo dia após dia para não perder espaço. As grandes marcas, por sua vez, gastam verdadeiras fortunas e mantêm equipes inteiras focadas na elaboração das estratégias, produção de conteúdo e monitoramento (não apenas das campanhas, mas também do público, da reputação, das novas tecnologias e plataformas, das ferramentas, etc.) para garantir presença nas mídias sociais ao longo dos anos.
O fato é que o online exige muito planejamento, uma dose ainda maior de dedicação e tempo. Não existe mágica. Reputação nas mídias sociais não se constrói da noite para o dia.
Observe os candidatos que estão à frente nessa área. Todos eles chegaram ao período eleitoral já com uma sólida rede construída. Planejaram suas estratégias. Pesquisaram seus públicos. Puderam avaliar, por exemplo, quais as plataformas que seus públicos-alvo mais utilizam, como se comportam, quais seus principais anseios, que tipo de discursos os aproximam e quais aqueles que os distanciam. Quais são os temas mais polêmicos para esses grupos e quais os mais sensíveis. Onde há concordância e onde cada público diverge, embora estejam todos sob uma mesma “bandeira”. Qual é a melhor abordagem para cada grupo, cada plataforma e cada interação.
Também conseguiram mapear os mecanismos de cada plataforma, suas ferramentas, características, estilos, vantagens e desvantagens, como os usuários se comportam em cada uma delas, qual o perfil dos usuários que utilizam apenas uma plataforma, e daqueles que utilizam mais de uma. Identificaram qual o tipo de material deveriam postar em cada uma delas, bem como a linguagem e a periodicidade.
E todas essas informações – além de diversas outras que são avaliadas na fase de planejamento – permitiram a definição do foco e da melhor estratégia para alcançar os resultados desejados.
Sim. Eles tiveram todo esse trabalho antes de definir, por exemplo, se teriam uma página ou um perfil nesta rede social, ou se teriam um perfil pessoal ou profissional naquela outra. Ou ainda qual seria a “cara” de cada página (ou perfil ou as duas coisas) em cada plataforma e que tipo de material publicariam.
Quando iniciaram suas ações, já sabiam exatamente para quem iriam falar em cada uma das plataformas, o que diriam, quando e como o fariam. Não foi um jogo de tentativa e erro. Nada foi feito de maneira aleatória ou amadora.
É preciso ter claro que nas redes sociais, assim como acontece na vida off-line, quando se fala para todo mundo, genericamente, a chance de a mensagem atingir alguém é próxima de zero.
E quem trabalhou muito no planejamento da estratégia antes de entrar no online, sabe que o esforço nunca termina. No dia a dia é preciso monitorar e avaliar constantemente, corrigir rumos sempre que necessário.
Nas mídias sociais tudo é muito ágil. O tempo entre o monitoramento, a avaliação das ações e a eventual correção de rumo não pode ser longo ou implicar em interrupções bruscas de exposição. É preciso ouvir a audiência, entendê-la e agir para encontrar sempre os melhores caminhos para atrair, engajar, empolgar.
E essa é a beleza das mídias sociais: elas nos dão voz, mas também nos permitem ouvir. Quem se dispõe a escutar com atenção, entender realmente o que está sendo dito e se adaptar, consegue resultados melhores. Na dinâmica das redes sociais, até mesmo quando a audiência não diz nada, já está se manifestando: está dizendo que não têm interesse no assunto e/ou abordagem. E quem está trabalhando na construção da reputação precisa estar atento, disposto a reavaliar, entender e reposicionar.
E é claro que quem começa a trabalhar o online apenas durante o período eleitoral fica em desvantagem. Mesmo que tenha feito um exímio planejamento estratégico, não tem o tempo necessário para retornar às suas pesquisas e identificar os motivos de eventual falta de interesse ou rejeição deste ou daquele tema ou abordagem. E encontra dificuldades para retomar esses assuntos que são de seu interesse de outras maneiras, nas diversas plataformas, e encontrar realmente o melhor caminho para se comunicar com cada público. Durante a campanha eleitoral, as redes sociais dos candidatos são o foco. Todos estão de olho. E todo e qualquer deslize será amplificado pelos opositores. Ou ainda pior: pelos simpatizantes dos opositores, especialmente daqueles que começaram a trabalhar mídias sociais com antecedência e já contam com um contingente considerável de apoiadores trabalhando por conta própria para exaltar o escolhido e atacar ou neutralizar os opositores.
Se você está acompanhando o assunto Eleição 2018 nas mídias sociais, é exatamente isso que está assistindo: pessoas engajadas – muitas das quais sem qualquer ligação pessoal ou profissional com os candidatos e suas equipes de campanha – atuando para elevar o discurso de seus escolhidos e minimizar/bombardear o dos opositores. Enquanto isso, outros tantos candidatos patinam nos baixos índices de adesão, independentemente de suas “bandeiras” serem consideradas boas ou não pela população.
Esse quadro irá se repetir nas eleições municipais de 2020. Muitos dos candidatos a prefeito e vereador nos 5.500 municípios, hoje, dormem tranquilos. Acreditam que a eleição municipal ainda está longe. Não é hora de se preocupar com isso. Não percebem, porém, que no online a campanha municipal já começou para muita gente.
Muitos dos futuros candidatos já iniciaram seus trabalhos nas mídias sociais – eles entendem que, na dinâmica do online, ter tempo para construir a reputação é fundamental.
Alguns de nossos clientes se deram conta da necessidade de estratégia, planejamento e tempo de execução exigidos pelas redes sociais ainda durante o último pleito. Por isso, tão logo saíram os resultados das urnas, dois anos atrás, iniciaram suas ações para construção de suas redes.
Vários deles apostam na consolidação de seus nomes nas redes sociais para garantir vaga para a disputa do cargo almejado. Sim, pretendem usar suas reputações online para se credenciarem como candidatos.
Em 2020, esse grupo que hoje trabalha na construção e consolidação de suas redes sociais não precisará esperar o começo do período permitido de propaganda eleitoral para divulgar seus feitos, projetos, bandeiras. Já haverá uma audiência engajada e disposta a fazer isso por cada um eles.
Grupos de WhatsApp criados e administrados por simpatizantes – que não integram nem integrarão a equipe do candidato – estarão “fervendo”, com discussões e disseminação de informações a respeito deste ou daquele nome. Informações (verdadeiras ou falsas) circularão diariamente pela rede, compartilhadas por usuários independentes, sem vínculo pessoal ou profissional com o candidato e sua equipe. Muitos estarão recomendando este ou aquele nome aos familiares, amigos e conhecidos, não apenas nas mídias sociais, mas também nas conversas off-line, cara a cara. E essa campanha boca a boca não é algo fácil de ser quebrado. As pessoas, em geral, tendem a confiar mais nas recomendações de conhecidos do que no que é divulgado pela mídia tradicional, governos ou empresas. Conhecidos de conhecidos, de acordo com pesquisas, também são impactados. Lembre-se de quantas vezes você optou por um produto ou serviço (ou rejeitou) porque um conhecido contou a experiência de um amigo dele.
Boa parte da classe política, porém, ainda não teve essa percepção. Muitos ainda dizem preferir “economizar” no trabalho com redes sociais ao longo de três ou quatro anos e deixar para “gastar” com isso só mesmo no período eleitoral. E é exatamente o que fazem: apenas gastam dinheiro com mídias sociais durante a campanha, sem alcançar os benefícios que elas poderiam oferecer se tivessem entendido como elas realmente funcionam.
Alguns buscarão contratar equipes reconhecidas, a peso de ouro, mas que não conseguirão entregar os resultados desejados simplesmente porque não haverá tempo para isso. Outros vão preferir uma “solução caseira” ou aquela agência ou pessoa que “cobra pouquinho” apenas para poder dizer que, sim, eles também incluíram as mídias sociais em suas campanhas, “mas não funcionou”.
Em outras palavras, estarão apenas desperdiçando tempo, dinheiro e potencial porque perderam o “timing”. Deixaram passar a oportunidade de levar seus pontos de vista, suas propostas, crenças, ações, seus ideais, seus sonhos, nomes, imagens ao conhecimento das pessoas. Não participaram da conversa ao longo de quatro anos. Ficaram fora do debate por muito tempo, acreditando que nas redes sociais tudo é instantâneo.
Durante o período de propaganda eleitoral, dificilmente conseguirão arregimentar uma robusta rede de apoiadores para ajudá-los a transmitir suas mensagens.
Só então perceberão a verdadeira dinâmica das mídias sociais: é necessário construir sua presença na rede antes de precisar dela.
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Cíntia Cury é jornalista. Diretora da Exterior Editora/MarcoIten.Com atua em Assessoria de Imprensa; treina equipes de Comunicação, elabora o Planejamento Estratégico de Comunicação e gerencia reputação de Órgãos Públicos, políticos e Mandatos. Atuou na Assessoria de Imprensa/Secretaria de Comunicação do Governo do Estado de São Paulo, durante os governos de Mário Covas, Geraldo Alckmin, Cláudio Lembo e José Serra. É autora do livro Assessoria de Imprensa para Prefeituras, Órgãos Públicos e Mandatos, da Exterior Editora.